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quarta-feira, 7 de março de 2018

SOBRE A LÍNGUA PORTUGUESA

Excelente trabalho de análise. Agradecimento ao autor pela gentileza de permitir a reprodução. (Luna)

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Normas e Variações numa distinção entre o Obsoleto e o Essencial Linguístico - TCC (2012)

4.1.9 Resumo:
O dilema entre as variações linguísticas e a gramática normativa; seus conceitos; interpretações equivocadas a respeito da normatividade da Língua Portuguesa; a busca pelas essências da linguagem em detrimento das vaidades teórico-acadêmicas. A adequação como solução, como equilíbrio na maneira mais integral de lecionar a língua portuguesa, sem extremismos prejudiciais, promovendo o entendimento linguístico contextual, e não meramente parcial.


INTRODUÇÃO

Tratar-se-á no presente artigo, da solução para os dilemas polêmicos entre a gramática normativa e as variações linguísticas, bem como as suas definições e finalidades em detrimento do que se considera essencial dentro da Linguagem.

Visualizando o esclarecimento pleno das vantagens e desvantagens na Língua Portuguesa, em seu status quo, da existência de suposta normatividade ou inexistência de verídica norma. Posto que, de forma análoga ao Direito, o Português não apresenta uma normatividade absoluta, mas meramente sociocultural.

Propõe-se também demonstrar desde a sua gênese que a Língua Portuguesa e suas variações; são exemplificações de uma mesma existência, com equiparada valoração histórica e científica.

Nesse segmento, discorrer-se-á não só conceitos, mas atitudes docentes que serão vinculantes no que diz respeito à regência desses temas tratados neste labor, não por reconhecimento consensual, dado que não há consenso, mas pode haver consciência quando se há mais equilíbrio e menos extremismos doutrinários baseados, ainda que se neguem, em teorias.

DESENVOLVIMENTO

1. Gramática Normativa versus Variações Linguísticas – Conceitos - Finalidades;

Segundo Pasquale Cipro Neto e Ulisses Infante (1997 apud BAGNO, 2004, p. 65): “A gramática normativa estabelece a norma culta, ou seja, o ‘padrão linguístico que é considerado modelar’ [...]”. Nesse sentido, é um modelo criado pelos ditos cultos, predominantes sociais, do que deve e não deve ser feito no uso da escrita, tornando este uso – taxativo - em regras oficiais. Ela calcifica a linguagem, dando-lhes ossos com determinada estrutura, causando perda da flexibilidade linguística, quando ela confronta a criatividade, a liberdade. A Gramática Normativa quer dizer submissão à tradição, pois é o tradicionalismo linguístico que constrói gramáticas normativas, decaindo paradoxalmente, pois até tradições mudam, evoluem, e a norma gramatical intenta ser fixa, imutável, tornando-se questionável temporalmente.

Há tempos a Gramática Normativa ou Tradicional, desestabiliza-se diante de uma verdade linguística não instituída, mas inerente às linguagens humanas: as variações. Neste embate, ter-se-á de um lado, um ente criado que tenta impor-se de forma aristocrática, das classes mais privilegiadas às menos, exigindo adequação e condenando à exclusão. Do outro lado, um instituto não criado, mas um fato em toda linguagem, mitificando a raríssima possibilidade de uma língua pura e imutável, pois onde há uma língua, praticada por falantes em diferentes espaços geográficos, distintas classes socioeconômicas, há as chamadas Variações Linguísticas.

1.1. Essências da Linguagem: Comunicação;

Percebe-se nas discussões linguísticas a omissão ou desconsideração de fundamentos elementares da linguagem. Por exemplo, como há de se falar em erro, em correto e incorreto, normatividades e afins, sem refletir antes se está havendo êxito no objetivo da linguagem: a comunicação? Toda e qualquer linguagem, desde os primórdios, visa à comunicação entre os interlocutores, e mais importante que teorias e extremismos ideológicos é descobrir se a comunicação foi concretizada.

Se as variações contribuem ou não, se as normatividades são barreiras prejudiciais, são meros acessórios de um cerne linguístico que deve ultrapassar as vaidades acadêmicas que ficam estagnadas entre dizer o que é certo e errado, o que é culto ou não, sem fundamentos legais, ao invés de, compreender o contexto da discussão, com o intuito de aprimoramento não somente estético, mas funcional, ou seja, visando a melhoria da comunicação entre os seres falantes.

2. Análise da Normatividade da Língua Portuguesa;

Para compreender a normatividade pretendida pela gramática normativa (norma culta), é preciso entender a ideia de normatividade em si.
As normas são regras, e todas elas precisam de fundamentos que as tornem autossuficientes para serem seguidas facultativamente ou obrigatoriamente. Estes fundamentos podem ser legais, provenientes da força da lei (aspecto jurídico) ou culturais, de cunhos socioeconômicos, consuetudinários (costumes), essa ultima, será a que criará uma falsa normatividade.

A Língua Portuguesa tem fundamento legal em alguns prismas como a definição de língua oficial da República Federativa do Brasil (Estado) no Art.13 da Carta Magna de 1988, bem como o decreto-legislativo que institui o Acordo Ortográfico, definindo a maneira correta de determinadas ortografias e pontuações. Entretanto, não contém bases legais em todo contexto, é diferente do Direito, pois o Direito tem um órgão, tal qual é o árbitro em qualquer que seja a controvérsia no âmbito jurídico: o Supremo Tribunal Federal, ele analisa e sua resolução é de fato: normativa, vinculante, de caráter irrevogável; sem possibilidade de recurso. Nem a Academia Brasileira de Letras, e nenhuma outra instituição acadêmica possui esta autoridade, comportam-se apenas como institutos norteadores, conselheiros, embora com tanto renome, não têm força de lei, assim sendo, como suas doutrinas são normativas sem embasamento legal? Elas tornam-se referências, mas referências meramente culturais, por tradição ou influência política.
Dessa forma, essas instituições, podem ser equiparadas a grandes nomes - honráveis gramáticos - linguistas, como Houaiss; Aurélio Buarque de Hollanda, Evanildo Bechara, que têm uma autoridade por tradição, o que significa admitir um respeito; questionável, tanto que há oposições também clássicas as suas lições, porém, mais importante que isso, é perceber que há uma distinção entre o poder que representam culturalmente e a ausência que possuem para produzir, de fato, uma normatividade legal - a única - a qual se há a obrigação de obediência.

Portanto, não há o que se falar em normatividade neste embate entre gramática normativa e variações linguísticas, pois não há norma legal definindo vertente certa e errada, mas apenas divergências ideológicas, doutrinárias entre linguistas e falantes que defendem pontos de vistas personalíssimos, subjetivos, muitas vezes de caráter estético, esquecendo que não possuem poder de resolução. Têm competência legítima para opinar, não para definir.

3. Raízes da Língua: Ramificações Linguísticas; As Variações de um Organismo Vivo.

O estudioso Fernão de Oliveira afirmou no séc.XVI, que “os homens fazem a língua e não a língua os homens”. Percebe-se na citação anterior, que a linguagem desenvolve-se posteriormente aos humanos, sem eles, a linguagem inexistiria. Além disso, os homens são seres mutáveis, e sendo processos, suas invenções estão suscetíveis às instabilidades, progressivas ou não. A língua é como um ser vivente, inclusive, sofre metamorfoses, não autônomas, mas criadas pelos próprios falantes. Aliás, ela só existe quando seus usuários fazem uso dela.

O que são muitas línguas se não a evolução de outras? O português descende da família linguística indo-europeia, é uma língua latina (advinda do Latim), assim como o Italiano. A língua lusitana que desembarcou aqui no Brasil nas embarcações portuguesas colonizadoras, irrefutavelmente, sofreu influencias, absorveu bastantes dialetos indígenas já existentes por aqui, tanto que o Tupi está presente no corpo da Língua Portuguesa, ou seja, suas raízes são amplas.
Na linguagem corporal, pode-se comunicar determinada mensagem de várias formas diferentes, da mesma maneira pode ocorrer linguisticamente, tanto no dito quanto no escrito.

Existe uma flexibilidade humana para criar, modificar, adequar, aperfeiçoar; e é isto que acontece com a relação do humano com a linguagem, uma história de evoluções, como por exemplo, a expressão “vossa mercê” dos tempos coloniais, que evoluiu sucessivamente a "vossemecê", "vosmecê", "vancê", e contemporaneamente: “você”. Noutra língua, o castelhano, algo similar ocorreu com o termo vostede, palavra equivalente hodiernamente ao usted (originária de "Vuestra Merced"), palavra com similar significado do exemplo supracitado.

CONCLUSÃO

4. Docência com Bom Senso – Abordagem Transculturalista.

Após a exposição acima, referente à inexistência de normatividade absoluta no usufruto da língua portuguesa; da inerente existência de variações linguísticas nas línguas; da supremacia do caráter essencial da linguagem que evidencia a comunicação como alvo precípuo. Indaga-se: O que ensinar? Como ensinar?

Quando se ensina – preferencialmente – uma linguagem popular (variações), sem considerar a exigência e importância da compreensão da suposta norma culta, que é – obviamente – a mais requisitada em provas oficiais: concursos; vestibulares, comete-se um equívoco extremista, em que pesa a fuga da realidade. A normatividade existirá quando houver predeterminação: em editais de seleções públicas, e provas discursivas, enfim, a realidade ordena o bom senso. Na mesma proporção, lecionando – somente – norma culta, formar-se-ia acadêmicos eruditos, pressupõe-se, que mais censurariam do que criariam, engessando algo de sublime mutação: a linguagem. Ainda haveria sempre uma tendência aristocrática de favorecimento dentre as tantas formas cultas. Além de que, os momentos informais não mais existiriam, já que a norma culta imperando, não admitiria as idiossincrasias naturais presentes do cotidiano, como os amantes que profetizam juras em que pronomes iniciam frases.

Dessa forma, deve-se recorrer à sabedoria milenar, em que os extremismos são dispensados, como uma corda de violão que nos extremos ficaria desafinada, alcançando seu êxito musical quando afinada com equilíbrio, na tonalidade adequada. Ou seja, a adequação linguística é mais importante que uma ou outra forma. É preciso saber falar ao povo, mas também é necessário – se preciso – comunicar aos ditos eruditos, dominando a língua portuguesa pelos contextos, e não por partes meramente relativas.

Usar língua como instrumento de liberdade, de inteligência criativa, e limitando-a apenas como forma consciente de uso, de adequação, e não norma definidora de certo e errado. A língua pertence a todos, e todos podem produzir, distintamente. As algemas que atribuem às línguas são fictícias, são criações dos próprios falantes e linguistas. Deve-se ensinar não o correto, mas o adequado, pois o certo e errado limitam, enquanto o adequado e o inadequado - possibilitam.

Referências Bibliográficas:
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15. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2008/Decreto/D6583.htm

Smadson Silva Pereira Lima
*Licenciado em Letras pela Faculdade de Tecnologia e Ciências.
Funcionário Público Efetivo – Secretaria de Defesa Social de Pernambuco.
Smadson Sipeli - 2009

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